Decisão da Câmara Criminal considerou atípica a conduta do apelante, em relação à teoria da imputação objetiva e à ausência de culpa.
“Ainda que se entendesse de maneira diversa, não se constata culpa na conduta do apelante ante a imprevisibilidade objetiva do resultado”. Este foi o entendimento da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) ao dar provimento à Apelação n.º 0000134-94.2012.8.01.0004, para absolver Amarilzo dos Santos Ribeiro, condenado em 1º Grau pela prática de homicídio culposo (acidente de trânsito), ocorrido em dezembro de 2011, no município de Epitaciolândia.
O Colegiado, por maioria, convenceu-se de que Amarilzo dos Santos não poderia prever que conduzir veículo automotor em velocidade abaixo da máxima para a via, atentando à cautela necessária para a conversão que pretendia, resultaria em colisão com veículo que adentra em sua traseira inopinadamente, “notadamente considerando que o laudo pericial afirma a irregularidade e falta de cautela apenas do outro acusado”.
“O resultado ocorrido não pode ser imputado ao apelante, à luz da teoria da imputação objetiva, pois, apesar de haver ele criado um risco, o resultado ocorreria ainda que ele atuasse observando o seu dever de cuidado, de forma que o risco por ele criado não se realizou no resultado”, diz o acórdão nº 19.099, da relatoria do desembargador Francisco Djalma.
Participaram do julgamento os desembargadores Francisco Djalma (presidente e relator), Samoel Evangelista (membro efetivo) e Pedro Ranzi (membro efetivo). A decisão está publicada na edição nº 5.470 do Diário da Justiça Eletrônico.
Entenda o caso
De acordo com a denúncia formulada pelo Ministério Público Estadual (MPE), no dia 30 de dezembro de 2011, por volta das 20h, no quilômetro 13, da rodovia BR-317, em Epitaciolândia/AC, Amarilzo dos Santos, conduzindo um caminhão Mercedes-Benz, colidiu com o veículo Pampa, conduzido por Ozair José da Silva, advindo desse fato a morte de Altamiro Martins Medeiros, um dos passageiros do Pampa.
Em Juízo da Vara Única Criminal da Comarca de Epitaciolândia, Amarilzo dos Santos foi condenado a uma pena de dois anos de detenção, em regime aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade, além de 30 dias-multa, com a suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores pelo prazo de um mês, “nos termos do Art. 302, da Lei n.º 9.503/97”.
Inconformado com a sentença de 1º Grau, Amarilzo dos Santos recorreu ao Tribunal de Justiça (Câmara Criminal), argumentando a ausência de provas cabais contra si, alegando, para tanto, que o condutor do Pampa foi o único culpado pelo acidente, haja vista que adentrou inopinadamente na traseira de seu caminhão, sem que este tivesse tempo de reagir.
Em seu apelo, Amarilzo afirma, ainda, que imprimia velocidade mínima na pista, conquanto acabara de reduzir a velocidade para que pudesse realizar uma conversão logo em seguida.
O voto do relator
Ao analisar o caso, o desembargador Francisco Djalma (relator) constatou a atipicidade da conduta do apelante (Amarilzo dos Santos), ante a impossibilidade de se imputar a ele o resultado ocorrido, à luz da teoria da imputação objetiva.
“Na hipótese em apreço, a conduta do apelante, de fato, criou um risco, pois conduzia seu veículo automotor em velocidade mínima na via, haja vista que intencionava fazer uma conversão à direita. Contudo, tal fato não exclui o dever de cuidado do motorista que vinha atrás, especialmente tendo em vista que acabara de sair de uma curva, motivo pelo qual deveria ter agido com cautela para verificar a presença de veículos na pista logo em seguida”, enfatizou o desembargador-relator ao proferir seu voto.
Segundo o relator, na situação ora apresentada, observou-se que, apesar de o apelante ter imprimido um risco ao conduzir seu veículo com velocidade mínima permitida para a via, e, com essa atitude, aumentara o risco de que o outro acusado colidisse em sua traseira, a obrigação era do outro acusado, Ozair José da Silva, de imprimir velocidade compatível com a situação de curva que se apresentava na rodovia, além do que deveria ter mantido certa distância do veículo da frente.
Ainda em seu voto, Francisco Djalma aponta que o laudo pericial criminal (exame de ocorrência de trânsito com vítima fatal), em sua conclusão, é claro ao afirmar que a causa determinante para a colisão em questão fora a irregularidade do comportamento do motorista do Pampa, e reproduz trecho do documento: “Ante o exposto, conclui o signatário que a unidade veiculares V1, V2 estiveram envolvidas em ocorrência de trânsito (colisão), tendo como causa determinante para o evento o comportamento irregular por parte do condutor da unidade veicular V2 (Pampa), no momento do fato, nas circunstâncias e extensões retromencionadas.”
“Dessa forma, constatando-se que a colisão era inevitável, ainda que o apelante não tivesse criado o risco, tendo em vista que o condutor do veículo, que vinha logo atrás, agira com imprudência, não há como se imputar ao apelante o resultado ocorrido. Insta ressaltar, por oportuno, que a irregularidade do motorista do veículo Pampa não se esgotara no sentido de ter agido sem a cautela necessária no trânsito, mas sim, no fato de que carregava pessoas na carroceria de sua caminhonete, local destinado ao compartimento de cargas”, enfatiza o relator.
“Ante o exposto, considerando-se ser atípica a conduta do apelante, tanto sob o prisma da teoria da imputação objetiva, quanto em relação à ausência de culpa no seu agir, vota-se pelo provimento da presente apelação para absolver Amarilzo dos Santos Ribeiro, ante a atipicidade da conduta prevista no Art. 302, da Lei n.º 9.503/97”, concluiu Francisco Djalma.