Sentença considera que restou “clara a culpa em sentido amplo” dos militares em ação que resultou em morte de homem.
O Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Rio Branco julgou e condenou o Estado do Acre ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil em favor das requerentes K. B de S. L. e T. K de S. L., herdeiras de Gildemar da Silva Lima, 24, também conhecido como “Alladin”, desaparecido desde setembro de 2013, presumidamente morto por integrantes do 2º Batalhão de Polícia Militar (BPM) da Capital.
A decisão, de autoria do juiz de Direito substituto Flávio Mundim, publicada na edição nº 5.747 do Diário da Justiça Eletrônico (fl. 35), dessa quinta-feira (3), considera que incide no caso a responsabilidade civil estatal (e o consequente dever de indenizar), em razão da demonstração “clara da culpa em sentido amplo dos policiais militares em relação à prática do crime de homicídio”.
Entenda o caso
Representadas por sua genitora, as menores autoras requereram judicialmente do Estado do Acre o pagamento de indenização por danos morais e pensão alimentícia vitalícia pelo desaparecimento de seu genitor, o auxiliar de pedreiro Gildemar da Silva Lima, também conhecido como “Aladdin”, presumidamente morto (uma vez que até hoje o corpo não foi encontrado) no dia 9 de setembro de 2013, em uma atuação clandestina de integrantes do 2º BPM.
Em síntese, as infantes alegaram que na data mencionada, por volta das 21h30min, a vítima foi retirada à força de sua residência, no Loteamento Praia do Amapá, pelos policiais militares “Girley Lemes da Costa, José Natalino Vieira de Souza, Maurício Gomes Ferreira e Bruno Fabrício Rodrigues Ferreira” e levada a “local ainda desconhecido” onde teriam praticado crime de homicídio e procedido à ocultação do cadáver.
Decisão
Após analisar o conteúdo probatório reunido durante a instrução processual, o juiz de Direito substituto Flávio Mundim, divergindo do entendimento do Ministério Público do Acre (MPAC), considerou que restou clara a “culpa em sentido amplo dos policiais militares em relação à prática do crime de homicídio (…) a atrair a responsabilidade civil estatal (e seu consequente dever de indenizar)”.
Nesse sentido, o magistrado destacou que também restaram comprovados os três elementos caracterizadores da obrigação legal do Estado em indenizar, “quais sejam, a existência de conduta perpetrada por agente público; resultado danoso a outrem; e relação mínima, mas suficiente, de vinculação de conduta e resultado (nexo de causalidade)”.
Flávio Mundim assinalou ainda os depoimentos do delegado responsável por conduzir as investigações dos fatos e do ouvidor do sistema de segurança pública do Estado, que foram categóricos ao afirmar que: não são raras denúncias de práticas abusivas por parte de milicianos do 2º BPM, que se valeriam de “métodos não convencionais para obter informações”, havendo “inúmeras reclamações sobre a conduta adotada pelos policiais integrantes (daquela unidade)”.
O magistrado também anotou o depoimento de um reeducando do sistema carcerário estadual, que teria informado à ouvidoria que os acusados já premeditavam o crime cometido contra a vítima. Segundo o detento, que supostamente também teria sido retirado à força de sua residência e torturado pelos acusados, os mesmos teriam afirmado: “o próximo que nós vamos pegar é o Alladin (Gildemar)”.
“Me amarraram, me torturaram, me bateram. Só não me mataram porque na hora em que fui pego na minha casa minha esposa viu e filmou, por isso que eles não me mataram”, teria dito o detento.
Por fim, considerando que a conduta ilícita dos militares acusados pelo crime, que enfrentam ainda processo administrativo e ação criminal, causou “profundo sentimento de tristeza” e “inequívocos danos morais”, o juiz de Direito substituto julgou a procedência parcial do pedido e condenou o Estado do Acre ao pagamento de indenização no valor de R$ 100 mil, bem como ao pagamento de prestação alimentícia mensal no valor de um salário-mínimo às autoras até que estas completem 25 anos de idade. A sentença estabelece ainda que os valores deverão ser “sempre atualizados” e repartidos igualmente entre as menores.
De acordo com o que prevê o art. 475 do Código de Processo Civil, a sentença exarada pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública está agora sujeita ao 2º grau de jurisdição, devendo, dessa forma, passar pelo reexame necessário do Tribunal de Justiça do Acre, que poderá confirmá-la ou não.