No Acre, a Vara específica de Proteção à Mulher foi implantada em 2009 na Comarca de Rio Branco. Desde a instalação foram registradas 791 condenações.
A Lei nº 11.340/2006, batizada de Lei Maria da Penha em homenagem a uma farmacêutica cearense que sobreviveu a 23 anos de violência doméstica, com o registro de duas tentativas de homicídio, e lutou para que seu agressor viesse a ser condenado, completou 10 anos em vigor no Brasil, no último domingo (7).
Para a titular da Vara de Proteção à Mulher da Comarca de Rio Branco, juíza de Direito Shirlei Hage, o impacto da aplicação da lei na realidade acreana é positivo, tanto pelo tratamento dado a mulher pela rede de proteção, quanto pelo acolhimento. “A ênfase tem sido o empoderamento, ou seja, para que cada vez mais seja divulgada a defesa dos direitos da mulher”, ressalta.
Dados fornecidos pela Vara de Proteção à Mulher da Comarca de Rio Branco apontam que atualmente tramitam naquela unidade judiciária 3.763 processos relacionados a casos de violência doméstica e familiar. Uma média de 8.500 inquéritos aguardam conclusão na Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher de Rio Branco (Deam).
Antes da sanção da Lei Maria da Penha, em 7 de agosto de 2006, o agressor respondia pelo delito com a prestação de serviços, multa ou doação de cestas básicas, conhecida popularmente como “sacolão”. A partir da entrada em vigor da nova lei, o agressor é condenado criminalmente.
No Acre, a Vara específica de Proteção à Mulher foi implantada em 2009 na Comarca de Rio Branco. Desde a instalação foram registradas 791 condenações.
Vítimas precisam de Justiça
O balanço de decisões judiciais que tiveram destaque sobre a temática no último mês assinala a realidade da violência nos municípios acreanos. Em Brasiléia, a Justiça sentenciou homem por ameaçar companheira com um terçado.
Conforme consta nos autos do Processo nº 0000049-72.2016.8.01.0003, o uso da arma branca pelo réu teve dupla finalidade. Teria sido utilizado tanto para ameaçar à vítima para que não o deixasse, quanto para que não entrasse na casa para pegar seus pertences (veja aqui).
Outro crime foi condenado pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Mâncio Lima, na qual H.O. S. ameaçou e manteve a ex-mulher em cárcere privado por três dias. Na época dos fatos, a vítima tinha 17 anos de idade e a pena estipulada foi de três anos e sete meses de reclusão, em regime inicial semiaberto (veja aqui).
No entanto, a violência não ocorre apenas contra companheiras. O Juízo da Vara Criminal da Comarca de Sena Madureira puniu filho por ameaça contra a mãe. Conforme os autos do Processo n° 0002863- 67.2015.8.01.0011, a divergência sobre a venda de uma colônia fez o réu prometer de morte e males graves. Contudo, de acordo com o Boletim de Ocorrência, ele tentou ainda agredir a senhora e não conseguiu, porque a mesma se trancou no quarto.
Rede de Proteção à Mulher
“Não imagino minha vida sem ele” frase que a juíza Shirlei afirma ouvir muitas vezes em audiência, evidência de que a dependência econômica e emocional aprisiona muitas vítimas.
O Acre possui duas redes principais de proteção à mulher: Rede de Cuidados no Enfrentamento à Violência contra a Mulher de Rio Branco (Reviva) e Rede Reviver no Juruá. O Poder Judiciário integra essa estrutura, que permite que se materializem as políticas públicas para combater a violência doméstica, familiar e sexual.
O atendimento garante acesso a direitos como saúde, educação, assistência social, segurança pública e justiça, caminhos que possibilitam a desconstrução do modelo relacional da violência.
Discussão de gênero é ampliada na jurisprudência
No fim de junho, em uma decisão inédita (veja), o Juízo da Vara de Proteção à Mulher da Comarca de Rio Branco impôs medida protetiva em favor de uma transexual vítima de violência doméstica, determinando que o agressor mantenha uma distância mínima de 200 metros da ofendida, bem como se abstenha, sob pena de ter sua prisão preventiva decretada, de manter contato “por qualquer meio de comunicação” com a ofendida, seus familiares e testemunhas.
A decisão proferida pelo juiz de Direito Danniel Bomfim, respondendo por aquela unidade judiciária, considerou que o sexo biológico de nascimento (masculino) não impede que a vítima, cuja identidade sexual é feminina, seja reconhecida como mulher, sendo ela, assim, “sujeito de proteção da Lei Maria da Penha”.
Medidas protetivas em números
A medida protetiva é uma determinação judicial, ferramenta prevista na Lei Maria da Penha. Em 2015, o total de medidas protetivas de urgência expedidas no Acre foram 1.961, sendo 1.082 proibições de conduta e 879 referentes a afastamento do lar.
Em 2016, já foram deferidas 891 medidas protetivas a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar em Rio Branco. Uma média de uma medida protetiva deferida para cada dois processos ajuizados na Vara de Proteção à Mulher da Comarca da Capital.
Hage esclarece acerca da execução da lei. “A determinação é cumprida por um oficial de justiça e a desobediência pode levar até a prisão. E há meios para efetivar essas medidas como as tornozeleiras e o policiamento, em que rondas policiais fazem verificação nas residências das vítimas”, enfatiza.
A magistrada acrescenta: “A Justiça dá a resposta que tá na lei. Por isso, caso aconteça alguma situação de violência, seja ela física, moral, psicológica e/ou intelectual, denuncie. Procurar ajuda evita que a situação se repita”.
O telefone da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180