Sentença considera comprovação de qualificadoras de “feminicídio”, “motivo torpe” e utilização de “recurso que impossibilitou a defesa da vítima”.
Um crime bárbaro que abalou a população riobranquense no primeiro semestre de 2016 e expôs de forma chocante a realidade da violência de gênero e do crime de “feminicídio” (homicídio por razões da condição de sexo feminino da vítima) chegou ao fim nesta quinta-feira (6) com a fase final do julgamento pela 1ª Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Rio Branco do réu A. dos S. S., acusado de matar sua ex-esposa, K. V. S. do N, em frente à Loja OK Magazine, no bairro Estação Experimental.
A Sessão do Tribunal do Júri, que foi presidida pela juíza de Direito substituta Ana Paula Saboya, culminou na condenação do réu a uma pena total de 27 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado, após os jurados o consideraram culpado pela prática de “feminicídio”, entendendo, dessa forma, que o crime crime de homicídio foi motivado pela condição de sexo feminino da vítima, em contexto de “violência doméstica e familiar contra a mulher” com a incidência das qualificadoras de “motivo torpe” e utilização de “recurso que impossibilitou a defesa da ofendida” (homicídio triplamente qualificado).
Entenda o caso
Segundo a denúncia do MPAC, o acusado teria matado K. V. no dia 29 de fevereiro de 2016 mediante golpes de faca, com emprego de “meio cruel” e utilizando-se de “recurso que dificultou a defesa da ofendida”, por não aceitar o fim do relacionamento que ambos mantiveram por cerca de quatro anos, “chegado ao fim algum tempo antes do evento criminoso”.
Ainda conforme a denúncia, o réu teria agido “motivado pela torpeza” e mediante “dissimulação”, uma vez que no dia do crime se dirigiu ao trabalho de K. V. “previamente armado com um facão (…) e dissimuladamente a convidou para conversar”, sendo que, no momento em que a vítima se aproximou, segurou-a pelo pescoço e passou a desferir os golpes de faca que a levaram a óbito no próprio local, tendo sido preso logo em seguida após uma breve perseguição policial.
A prisão em flagrante do réu foi convertida em preventiva pelo Juízo da 1ª Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Rio Branco no dia 1º de março de 2016, face à comprovação da materialidade do crime, à existência de “indícios suficientes” de autoria, incluída a própria confissão do réu em sede policial.
Decisão do Júri
Após os depoimentos das testemunhas e das alegações finais da acusação e defesa, os membros do Conselho de Sentença da 1ª Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Rio Branco consideraram A. dos S. culpado pela morte da vítima.
Os jurados também entenderam que restou comprovada no caso a prática de “feminicídio”, com a incidência também de outras duas qualificadoras: de “motivo torpe” e utilização de recurso que dificultou a defesa da ofendida (tendo o réu, portanto, cometido o crime de homicídio triplamente qualificado).
Sentença
A juíza substituta Ana Paula Saboya ao fixar a sentença considerou a culpabilidade extrapolada do acusado, bem como sua má conduta social; observada ainda a reincidência em crimes praticados contra a mulher a demonstrar “o desrespeito à família e ao gênero feminino” (por parte do réu).
A magistrada substituta também assinalou a motivação “torpe”, as circunstâncias “reprováveis” e as consequências “graves” do crime, “vez que a vítima deixou duas filhas adolescentes que passarão essa fase (…) sem a presença amorosa da mãe; (sendo ainda que) a filha mais nova presenciou a agonia” (da genitora, após ser atingida fatalmente pelo réu)”.
“A conduta atingiu também os colegas de profissão (da vítima), os trabalhadores das lojas vizinhas ao local e os clientes, (…) bem como abalou a sociedade riobranquense, tanto que motivou a criação de lei de combate à violência doméstica, sancionada sob nº 2.210, publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) 26, que institui o “Dia Municipal da Não Violência Contra a Mulher” a ser comemorado anualmente no dia 1º de março, denominada Lei Keyla Viviane Santos Nascimento”, registrou Ana Paula Saboya em sua sentença.
De acordo com o documento, o acusado deverá cumprir uma pena total de 27 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado, além de arcar com as custas processuais do julgamento, as quais foram fixadas no valor de R$ 5.600,00.
O réu, que também teve negado o direito de apelar em liberdade por permanecerem presentes os motivos que ensejaram sua prisão preventiva, ainda pode recorrer da sentença condenatória junto à Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Acre.