Desembargadora-presidente Cezariente Angelim participou em São Paulo de oficinas técnicas e científicas para subsidiar os magistrados em ações judiciais na área da saúde.
O Tribunal de Justiça do Acre avança a passos firmes e largos na direção de garantir aos cidadãos que as decisões judiciais relacionadas à saúde (medicamentos, cirurgias, tratamentos, procedimentos etc.) sejam tomadas com maior segurança, caráter científico, padronização e eficiência.
A desembargadora-presidente Cezarinete Angelim participou da primeira oficina dos Núcleos de Avaliação de Tecnologia em Saúde (NATs) e dos Núcleos de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NAT-Jus), no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. A atividade é resultado do termo de cooperação técnica firmado entre o CNJ e o Ministério da Saúde para subsidiar as ações judiciais na área da saúde.
“Um evento inovador, maravilhoso, de grande relevância para podermos avançar nesta questão, dando aos magistrados e, principalmente, aos cidadãos, maior conhecimento técnico, amparo científico, segurança e agilidade. Pretendemos fazer algo parecido, com o mesmo propósito (NAT-Jus) no âmbito estadual, estabelecendo permanente diálogo e união de esforços entre as carreiras jurídica (juízes, operadores do Direito) e médica (profissionais da saúde”, assinalou a presidente do TJAC.
Realizada nesta semana, a oficina no Sírio-Libanês abordou, entre outros temas, a elaboração e padronização de pareceres e notas técnicas, que servirão de subsídio científico aos tribunais para a tomada de decisão em ações relacionadas à saúde.
A presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, afirmou que as sentenças judiciais que dão acesso a remédios são parte da democracia, e que “a dor tem pressa”.
Segundo a ministra, a parceria vai minimizar os problemas de compatibilidade entre o atendimento coletivo e as demandas urgentes individuais. “O que nós estamos trabalhando é, com a criação desses núcleos, oferecer condições para imediatamente decidir com a informação precisa de médicos”, disse a ministra.
Supervisor do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, o conselheiro Arnaldo Hossepian também participou da cerimônia. “Nossa ideia é que em até 72 horas seja possível dar uma resposta ao juiz, que poderá ou não seguir o parecer. É possível que a demanda seja temerária e ele, desamparado de conhecimento técnico, tenda a atender o pleito, por tratar-se da vida de alguém”, explicou.
A primeira oficina contou com a presença de representantes dos tribunais de 10 estados: Acre, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins, mas apenas um presidente dos tribunais esteve presente, a do Tribunal de Justiça Acreano.
A importância
A capacitação de juízes ficará a cargo do Hospital Sírio-Libanês. A parceria da entidade hospitalar com o CNJ dará origem a uma plataforma com informações técnicas, com base em evidências científicas, para subsidiar os magistrados de todo o país. Na prática, ao se deparar com uma demanda por medicamentos ou tratamentos de saúde, o magistrado poderá contar com a consultoria de especialistas da área para auxiliá-lo em relação às informações técnicas.
Dor tem pressa
Na opinião da ministra Cármen Lúcia, há uma democratização da sociedade brasileira. “O cidadão que morria até pelo menos a década de 1980, antes da Constituição, não sabia que ele tinha direito à saúde, que podia reivindicar. Hoje ele vai à luta, porque a democracia voltou ao Brasil. Graças a Deus!”. Segundo a ministra, o seu papel como juíza é garantir o direito à saúde. “Eu sou juíza, não sou ministra da Fazenda. Não desconheço a responsabilidade dele. Eu não sou ministra da Saúde. Eu sou juíza, eu tenho a Constituição, que diz que é garantido o direito à saúde. Eu estudo que a medicina pode oferecer uma alternativa para essa pessoa viver com dignidade. Convenhamos, a dor tem pressa. Eu lido com o humano, eu não lido com o cofre”, disse.
Banco de dados
O banco de dados que subsidiará os juízes conterá notas técnicas, análises de evidências científicas e pareceres técnico científicos consolidados, emitidos pelos núcleos de apoio e avaliação, pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia no Sistema Único de Saúde (Conitec), além de informações da biblioteca do Centro Cochrane do Brasil (instituição sem fins lucrativos) e outras fontes científicas.
O hospital investirá, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde, cerca de R$ 15 milhões, ao longo de três anos, para criar a estrutura da plataforma, que estará disponível na página eletrônica do Conselho. Caberá ao CNJ resguardar as informações e torná-las acessíveis aos juízes.
Na opinião da ministra Cármen Lúcia, a falta desse tipo de informação técnica deixa os magistrados sem base para tomar decisões. “Os juízes, muitas vezes, decidem sem saber exatamente se aquele era o medicamento que era necessário, se não tinha outro tratamento. Porque a nossa especialidade não é essa”, ressaltou a ministra.
Gastos elevados
Levantamento do Ministério da Saúde mostra que, desde 2010, os gastos da União com ações judiciais para aquisição de medicamentos, equipamentos, insumos, realização de cirurgias e depósitos judiciais cresceram 727%. Só no ano passado, os gastos atingiram R$ 5 bilhões. Segundo o órgão, o Sistema Único de Saúde (SUS) terá de arcar com R$ 7 bilhões neste ano. Para o ministro da Saúde Ricardo Barros, que participou da cerimônia em São Paulo, as decisões judiciais dificultam o planejamento da administração dos recursos. “A sentença não cria um dinheiro novo, ela desloca um que já existe”, disse o ministro. Nesse contexto, a parceria com o hospital privado paulista, segundo Barros, é “importante para suprir a deficiência orçamentária”.
Área sensível
A judicialização da saúde é tema de constante preocupação no CNJ. Em setembro, foi aprovada a Resolução CNj n. 238, que dispõe sobre a criação e a manutenção de comitês estaduais de saúde, bem como a especialização em comarcas com mais de uma vara de fazenda pública.