Decisão considerou, dentre outros, a indisponibilidade da tutela jurisdicional do direito de crianças e adolescentes, especialmente em casos de menores “carentes”.
A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Acre (TJAC) negou provimento ao recurso interposto pelo Município de Rio Branco, nos autos da Ação Civil Pública (ACP) nº 0800033-11.2017.8.01.0081, no qual um garoto de quatro anos de idade (por meio de sua genitora e representante legal) pleiteia que seja-lhe concedida vaga compulsória em creche ou pré-escola no bairro em que a família reside.
A decisão, que teve como relatora a decana da Corte de Justiça, desembargadora Eva Evangelista, publicada na edição nº 6.307 do Diário da Justiça Eletrônico (DJE, fls. 2 e 3), também julgou improcedente o reexame necessário do processo, mantida, assim, a obrigação do Ente Público Municipal em atender ao pedido da parte autora, sob pena de incidência de multa diária.
Entenda o caso
O Ministério Público do Acre (MPAC) ingressou com a ACP após ser acionado pela genitora do menor, que alegara que o Município de Rio Branco deixou de providenciar o ingresso da criança em “creche ou pré-escola”, por “inexistência de vagas” na unidade educacional localizada no bairro onde a família reside.
O Município de Rio Branco, por sua vez, alegou não ter condições de cumprir com a demanda uma vez que a situação (falta de vagas) seria decorrente de escassez de recursos financeiros e do fato do Ente Público trabalhar atualmente dentro da chamada “reserva do possível” (teoria do Direito alemão segundo a qual, na busca pela efetivação dos Direitos Sociais, o Estado busca priorizar o atendimento do maior número possível de demandas, ainda que em detrimento de determinados pleitos, por limitações orçamentárias).
O pedido autoral foi julgado procedente pelo Juízo da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco, que considerou, dentre outros, a prioridade absoluta e o princípio da proteção integral de crianças e adolescentes, bem como o direito dos cidadãos e o dever do Estado em garantir o acesso à Educação. “A reserva do possível (ademais) não pode ser invocada com o intuito de frustrar ou inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Carta da República. A cláusula encontra limite na garantia do mínimo existencial, vale dizer, (uma) decorrência (do princípio) da dignidade da pessoa humana”, assinala a sentença.
Recurso
A desembargadora Eva Evangelista, decana da Corte de Justiça, ao proceder ao reexame necessário do julgado, bem como à análise do recurso impetrado pelo Município de Rio Branco insurgindo-se contra a decisão, considerou que o decreto judicial combatido deve ser mantido por seus próprios méritos.
O Acórdão de Julgamento destaca que a tutela jurisdicional do direito assegurado às crianças menores de seis anos de receber atendimento em creche ou pré-escola, “tem natureza de interesse indisponível, (…) notadamente no caso de crianças carentes”, como preveem a Constituição e o ECA.
Dessa forma, a relatora confirmou o entendimento do Juízo originário, igualmente rejeitando a alegação de aplicação da “reserva do possível” por parte do Ente Público Municipal demandado ao caso, face à legislação constitucional e menorista em vigor. “Se um direito é qualificado pelo legislador como absoluta prioridade, deixa de integrar o universo de incidência da reserva do possível já que sua possibilidade é preambular e obrigatoriamente fixada pela Constituição ou pela lei”, destacou a Decana do TJAC em seu voto.
Os demais desembargadores membros da 1ª Câmara Cível da Corte de Justiça acompanharam, à unanimidade, o voto da desembargadora relatora.