A ação ocorreu no Distrito Judiciário de Santa Rosa do Purus, em respeito às tradições culturais próprias dos povos indígenas
A diretoria do Distrito Judiciário de Santa Rosa do Purus, visando garantir a humanização e a atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana no atendimento em saúde aos povos indígenas, realizou neste mês de março a entrega de redes para serem utilizadas no serviço de acolhimento ambulatorial.
A ação foi realizada após contato com representantes do sistema público de saúde em atuação no município, que juntamente com o município vizinho de Manoel Urbano concentra quase cinco mil indígenas das etnias Huni Kui (Kaxinawás) e Kulina (Madihás), distribuídos em mais de 50 aldeias, ao longo do Vale do Rio Purus.
De acordo com os profissionais, a disponibilização de serviços médicos na região encontra um desafio adicional ao isolamento geográfico – a evasão de pacientes e acompanhantes indígenas, em decorrência do estresse experimentado durante períodos de internações, à ausência de um processo de acolhimento que contemple a diversidade cultural da população.
“Me foram descritas situações em que crianças afetadas por tuberculose e outras doenças são levadas para o hospital e, em alguns casos, os próprios pais fogem com elas. Isso me lembrou do curso de vivência na Aldeia Ashaninka Apitwtxa, quando durante uma palestra um líder daquele povo nos disse que, ‘para um indígena, estar em um hospital é como para um branco estar na selva’, é uma situação desconhecida, que provoca medo”, explicou a juíza de Direito Ana Paula Saboya.
O curso a que ela se refere, “O Poder Judiciário e os Direitos dos Povos Indígenas”, foi promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) em parceria com a Escola do Poder Judiciário (Esjud), em agosto de 2019.
Dessa forma, para tentar garantir condições de acolhimento que não causem tanto estranhamento cultural e, em consequência, estresse durante a realização de tratamentos de saúde, em comum acordo, a gerência da unidade local mista de saúde providenciou a instalação de armadores, ao passo que a magistrada se comprometeu a reunir doações de redes, juntamente com representantes do Ministério Público e da Advocacia, as quais foram entregues em visita ocorrida durante a última semana.
“Portanto, nós compreendemos que quando essas pessoas fogem, não é para negligenciar a saúde das crianças, mas porque eles têm medo. Assim, nossa ideia é tentar ‘acender uma luz na selva’, para ver se conseguimos criar uma sensação maior de aconchego, que permita que eles (os indígenas que vivem na região) possam receber um direito tão importante como é o da saúde, mas também sem abrir mão de outro direito tão valoroso quanto, que é o da dignidade da pessoa humana”, assinalou a magistrada.
O gerente geral da unidade mista de saúde de Santa Rosa do Purus, Gilson Rabelo, por sua vez, destacou a ocorrência pretérita de “várias situações em relação à evasão de pacientes, principalmente devido à questão cultural dos indígenas, uma vez que estes não se adaptam bem ao pernoite nos leitos normais, ou seja, nas camas disponíveis na unidade de saúde”.
“A equipe do hospital da família trata com muito carinho e respeito todas as etnias, tanto Kulinas quanto Kaxinawás e Jaminawás. E vale destacar que todos aqui são tratados da melhor forma justamente para que os tratamentos de saúde corram como é de se esperar e, principalmente, sejam realizados em sua integralidade”, concluiu Gilson Rabelo.