A redução da criminalidade e o enfrentamento da crise penal estão diretamente relacionados com a promoção da dignidade para pessoas em privação de liberdade e egressas do sistema penal e socioeducativo
O número significativo de encarceramento levou o Acre a figurar como o estado que mais prende no país e no mundo, de acordo com o Monitor da Violência. Atualmente, há 8.146 pessoas no sistema prisional. Em 2020, eram 8.174 pessoas no sistema prisional, ou seja, não há um esvaziamento dos presídios – ano após ano há mais jovens entrando no “mundo do crime” e grande parte dos que foram presos voltam a cometer novos delitos ao serem colocados em liberdade.
Assim, considerando o grau de instrução, a faixa etária, as condições socioeconômicas e até mesmo a raça e gênero, o diagnóstico do sistema prisional acreano apontou que há em comum entre as pessoas privadas de liberdade a condição de pobreza e a ausência de acesso às políticas de capacitação e empregabilidade.
Nesta quarta-feira, dia 23, o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC), o Ministério Público do Trabalho e os representantes do programa Fazendo Justiça, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), dialogaram sobre a política de atenção às pessoas egressas.
A desembargadora-presidente do Tribunal de Justiça do Acre apontou a necessidade da modernização das políticas de atenção às pessoas egressas, por meio de ações que promovam a geração de renda.
“Essa Administração promove parcerias, ações e medidas que estimulem o desencarceramento. O TJAC se comprometeu em reduzir a taxa de encarceramento em 10% até 2026, então para alcançar essa meta em um curto prazo temos voltado a nossa atuação para o aperfeiçoamento da gestão criminal e o desenvolvimento de políticas afirmativas, que têm renovado nossas esperanças”, ressaltou a desembargadora Waldirene.
Em sua fala, a presidente destacou a articulação realizada pelo Poder Judiciário acreano entre as instituições como o Ministério Público estadual, Ministério Público do Trabalho e Defensoria Pública, o que garantiu a proposta de lei estadual para a construção da Política de Atenção ao Egresso no Estado do Acre
O procurador-chefe do Trabalho Carlos Oliveira e a procuradora do Trabalho Marielle Rissane explicitaram a disponibilidade do MPT para ampliar a atuação em ações estratégicas, afirmando que para o ano de 2022 há metas específicas em planejamento.
Assim, para consolidar esse alinhamento entre as instituições o coordenador do Eixo 3 (Cidadania) do programa Fazendo Justiça, Felipe Athayde, destacou que há normativos vigentes que estruturam o programa Fazendo Justiça. Em 2018, o Decreto n° 9.450 instituiu a Política Nacional de Trabalho no âmbito do Sistema Prisional, voltada à qualificação e oferta de vagas de trabalho intramuros e também para pessoas egressas. No ano seguinte, o CNJ por meio da Resolução n° 307 instituiu a Política de Atenção a Pessoas Egressas.
“Entretanto, os principais obstáculos para o cumprimento das cotas legais que garantam oferta de emprego para pessoas egressas tem sido a ausência de fiscalização, bem como a ausência de órgãos de gestão de vagas e contratos”, apontou Athayde.
A consultora do programa Fazendo Justiça no Acre, Pâmela Villela, explicou sobre o funcionamento dos escritórios sociais. “Há 29 escritórios sociais em 18 unidades federativas. Nesse sentido temos que destacar o protagonismo do Judiciário estadual para efetivar essa iniciativa, houve a assinatura do plano executivo estadual e nesta semana, a equipe multidisciplinar está em treinamento para iniciar o trabalho dessa rede de atenção”, disse a consultora.
Na oportunidade, a juíza-auxiliar da presidência do TJAC Andrea Brito indicou que está sendo construída uma proposta de um programa de desenvolvimento profissional e inclusão social pelo trabalho, visando atender mulheres egressas do sistema prisional acreano e para as que estão submetidas ao cumprimento de penas alternativas.
“A ausência de qualificação e formação profissional unida à precária formação educacional dificultam e/ou impedem que esse público tenha uma chance de emprego. Então, a oferta de cursos profissionalizantes pode significar a diferença entre a escolha por retornar a criminalidade ou uma vida integrada à sociedade, com trabalho digno e honesto, por isso se faz necessária a ampliação e qualificação das políticas de oferta de vagas e empreendedorismo que promova inclusão social das pessoas egressas do sistema prisional”, enfatizou Brito.
A geração de renda e oportunidades é um fator favorável a ressocialização e mudança da trajetória de pessoas que estão em situação de vulnerabilidade, visto que as pessoas que cumpriram uma pena apresentam vulnerabilidades específicas relacionadas à educação, moradia, retomada dos vínculos familiares, comunitários e laborais. Portanto, a articulação entre as instituições é um dos pilares para a prática do enfrentamento dessa problemática social e da crise penal.
Cotas de vagas para egressos
A cota de vagas para egressos passou a existir a partir da instituição da Política Nacional de Trabalho no âmbito do Sistema Prisional (PNAT), regimentada pelo Decreto n° 9.450, de 24 de julho de 2018.
O debate movido na videoconferência representa o esforço para que esse direito se torne material, ou seja, garantir que a cota seja a porta de emprego para quem sai do sistema prisional e facilite o acesso à novas oportunidades, respondendo as dificuldades estruturais com trabalho. Essa é uma ação afirmativa voltada para a promoção de cidadania, mas também uma estratégia de prevenção contra o crime.
No artigo 5º, há a imposição para que a Administração fixe nas licitações a exigência de cotas de mão de obra formada por pessoas presas ou egressas do sistema prisional. Dessa forma, a empresa selecionada deve reservar 3% das vagas quando a execução do contrato demandar 200 ou menos funcionários; 4% quando exigir entre 201 a 500; 5% quando demandar entre 501 a 1.000 funcionários; e 6% quando exigir mais de 1.000 empregados.
Em 2021, foi sancionada a Lei n° 14.133 e o dispositivo também prevê a reserva de vagas para contratação de pessoas em vulnerabilidade social, como os presos. A lei reiterou a necessidade de previsão de cotas nos contratos (as quais devem ser mantidas em todo o curso da execução do contrato) e estabeleceu a possibilidade de rescisão unilateral, pela Administração Pública contratante, se houver descumprimento dessa regra.
Assim como no Poder Executivo, existe a previsão de cotas para o Poder Judiciário. A Resolução CNJ n° 307, de 17 de dezembro de 2019, instituiu a Política de Atenção a Pessoas Egressas do Sistema Prisional e nela, além dos procedimentos, diretrizes e a metodologia de trabalho está a previsão de cotas de contratação de pessoas egressas pelo Poder Judiciário, em moldes similares às cotas estabelecidas na política nacional.