Audiência Pública realizada na Assembleia Legislativa do Estado do Acre, na terça-feira, 8, trouxe instituições públicas e representantes dos movimentos sociais para discutir formas de enfrentamento aos feminicídios no estado
As mulheres que tiveram a vida interrompidas pelo feminicídio “estão presas em uma cova, sem direito à visita, sem direito a ver o filho”, falou emocionada Andréia Paulichen, irmã de Adriana Paulichen, mãe, com 23 anos de idade, assassinada pelo pai do seu filho no dia 9 de junho de 2021, no Bairro Estação Experimental, em Rio Branco. As palavras de Andréia, que ficou com a guarda do sobrinho, foram proferidas na Audiência Pública, que o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) participou, na quarta-feira, 8, realizada na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac).
A sessão, requerida pelo deputado Daniel Zen, atendendo solicitação do Conselho Estadual dos Direitos das Mulheres do Acre (CEDIM/AC), teve a participação de representantes do poder Executivo, Legislativo, Judiciário. Mas, especialmente, se fizeram presentes diversas mulheres engajadas nos movimentos feministas e de proteção aos direitos das mulheres: negras, indígenas, camponesas e trabalhadoras rurais, mães de filhos e filhas autistas, mulheres com deficiências, lideranças de movimentos sociais e representantes da sociedade civil.
O objetivo foi debater ações para enfrentar os casos de feminicídio no Acre, que é o estado com maior número desses crimes no país. O momento serviu para que diversas mulheres ocupassem espaços de fala, compartilhando dores, dramas, violências vividas, sonhos, anseios, dados, informações, desejos e proposições concretas para que todos e todas, órgãos públicos e sociedade, assumam sua responsabilidade para reduzir os casos de feminicídios e violência doméstica.
Representando a Justiça acreana, a juíza de Direito Andréa Brito, auxiliar da presidência do TJAC, declarou o respeito a cada uma das mulheres que tiveram a coragem de colocar suas histórias na Audiência Pública para sensibilizar homens e mulheres na luta contra esses crimes. A magistrada cumprimentou as participantes e os participantes em nome da desembargadora Waldirene Cordeiro, presidente do Tribunal, e da decana da Corte de Justiça Eva Evagenlista, em exercício na presidência e responsável pela Coordenadoria Estadual das Mulheres em Situação de Violência Doméstica e Familiar (COMSIV).
Aqui, infelizmente, é o lugar mais perigoso do Brasil para uma mulher viver, pois conforme dados apresentados pela procuradora Patrícia Rêgo, do Ministério Público do Acre (MPAC), o Acre lidera o ranking nacional há quatro anos no número de feminicídio.
Em seu pronunciamento, a juíza Andréa alertou que o aumento do tempo de punição não é suficiente para sanar o problema, “(…) porque dos seis feminicídios ocorridos no Acre nesse ano, em dois deles os homens também cometeram suicídio. O aumento da pena não reduz a violência, não reduz a vontade do homem em tirar a vida da mulher. O que importa para esse homem é a coisificação dessa mulher”.
Além disso, a magistrada auxiliar da presidência do TJAC enumerou as frentes de atuação do Judiciário. A instituição adotou como meta, o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 5, da Organização das Nações Unidas (ONU), para empoderar mulheres e meninas, combatendo e atuando contra a violência doméstica e familiar.
Ações do TJAC
O TJAC, por meio da COMSIV, está interiorizando o Programa de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e Intrafamiliar, com a criação dos grupos reflexivo com homens autores desses tipos de crime. Os grupos trabalham com uma metodologia específica, seguindo orientações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para esses autores não voltem a cometer os mesmos atos com outras mulheres.
Até este mês de junho a equipe do Judiciário estadual visitou 11 cidades do interior do estado, levando as propostas de implantação do programa às câmaras de vereadores e vereadoras, e ainda sensibilizando as autoridades locais. Essa mobilização já tem resultados, pois em Tarauacá e Cruzeiro do Sul foram aprovadas a legislação.
Outra iniciativa do Judiciário, voltada fornecer amparo e atenção às vítimas, é o programa Comv-Vida, lançado no final de maio. O programa fornecerá amparo as mulheres que sofreram com crimes de violência doméstica a partir de medidas protetivas e das audiências de custódia, identificando quais atendimentos e políticas públicas ela precisa acessar e fazendo os encaminhamentos necessários tanto para a mulher, quanto para a família da vítima.
União e continuidade
Durante a Audiência Pública, várias instituições públicas e movimentos sociais organizados apresentaram suas ações de enfrentamento a essa dura realidade. Mas, como cada mulher que pediu a fala reconheceu, inclusive, a magistrada do TJAC, é preciso união para elaborarmos soluções que sejam executadas de forma contínua.
“Hoje estamos aqui unidos em busca de soluções. Nós, temos sim, todas as instituições, têm feito muito, com nossos desafios orçamentários, inclusive geográficos, no enfrentamento à violência doméstica e ao feminicídio. E não há soluções simplistas, não há soluções que passem somente por valores, recursos, há soluções que passem nossas falas, pela nossa cultura machista e patriarcal”, disse Brito.