Projeto Cidadão leva serviços para comunidade no Alto Rio Purus

A equipe do Projeto Cidadão percorreu 214 km até Manoel Urbano, em seguida, viajou de barco por mais 24 horas, subindo o Rio Purus para levar orientações jurídicas, atendimentos médico e odontológico, além do tradicional casamento coletivo

Segundo José Casalta Nabais, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, a cidadania pode ser definida como “a qualidade dos indivíduos que, enquanto membros ativos e passivos de um Estado-nação, são titulares ou destinatários de um determinado número de direitos e deveres universais e, por conseguinte, detentores de um específico nível de igualdade”.

Para que o cidadão possa acessar os direitos e deveres é condição sine qua non, que possua documentos que o identifique. Por isso que o objetivo principal dos documentos pessoais é viabilizar a participação da pessoa na sociedade enquanto cidadão, isto é, possibilita o acesso a serviços públicos, como àqueles direcionados para saúde e educação, por exemplo. 

Assim age o Projeto Cidadão, o mais importante projeto social do Poder Judiciário do Acre. Há quase três décadas, vai até os locais mais distantes, estreitando a distância entre o Estado e o cidadão, ofertando justiça e cidadania, viabilizando o direito de “existir” para que exerçam seus direitos e deveres. A equipe do Projeto Cidadão percorreu 214 km, até Manoel Urbano, em seguida, viajou de barco a bordo do “Boiadeiro do Purus”, por 24 horas, conduzido pelo experiente Seu Nonato, subindo o Rio Purus.

Os atendimentos ocorreram na Escola Chico Mendes, na Comunidade Espírito Santo, nos dias 10 e 11 de novembro. Serviços de emissão de RG, CPF, atendimentos jurídicos, atendimentos médico e odontológico, testes rápidos e vacinas, além de distribuição de cestas básicas aos mais carentes.

 

 

A juíza Titular da Comarca de Manoel Urbano, Ana Paula Saboya, que acompanhou a missão traduziu a essência do Projeto. “Quando a gente lê na constituição sobre a dignidade humana, a gente vê que isso aqui é concretamente a dignidade humana. Se a distância distanciou o cidadão do Estado, nesse momento o Estado vem até ele”.

Nefson Garcia da Silva e Jaila Cardina Nunes, são casados e tem 2 filhos. Souberam da atividade através do rádio e foram em busca de consulta médica, vacina dos filhos e regularizar documentos. Jaila não esconde a animação em poder aproveitar a oportunidade. “Soubemos pelo rádio. Aproveitamos a chance porque meu marido só tem o registro de nascimento, e não tinha os outros documentos. Se não tivesse uma ação com essa, ia demorar um bom bocado pra gente resolver isso, pois até chegar na cidade demora quase um dia de viagem, fora as taxas. Acho muito importante uma atividade assim, é uma sorte nossa, porque ir até a cidade tem gasto pra ir e pra voltar e vindo até a comunidade está bem mais perto. Isso facilita muito. Agradeço muito demais, meu deus do céu!”.

O produtor rural Dhemes Souza Nascimento foi tirar a segunda via do RG, pois molhou a primeira, mas também buscou atendimento odontológico para extração de dente, e exame pré-natal para a esposa, que está grávida de 3 meses. Além do custo de combustível e de alimentação, tem o fator tempo, pois demora quase um dia de viagem até a cidade, assim, ele destaca a relevância em ter a oportunidade de usufruir tantos serviços num local só. “Eu soube através do agente de saúde que passou avisando. Poder fazer vários serviços num local só tão perto de casa é muito bom. Ser atendido por um projeto que é eficiente pra legalizar os documentos, pra nós é muito importante receber o Projeto Cidadão na comunidade do Alto Purus, pois moramos longe, distante da cidade, então ter esse acesso é bom demais. O benefício é enorme, pois ajuda várias famílias de ribeirinhos, e nós aqui da zona rural necessitamos muito de um projeto desse”, finalizou.

 

 

A juíza titular da Comarca de Manoel Urbano, Ana Paula Saboya, esteve presente conferindo as ações. Na ocasião, também realizou várias audiências, principalmente de Certidão de Nascimento tardias. Visitando pela primeira vez a comunidade, a magistrada foi recebida com fogos e alegria pela comunidade.

A magistrada falou de sua experiência, seu sentimento e destacou que atividades dessa natureza efetivam a carta magna do Brasil, sobretudo no tocante a dignidade humana. “A experiência tá sendo incrível, só essa palavra pode retratar o que estou sentindo. Muito gratificante ver a alegria do povo, as pessoas felizes por estar sendo assistidas. Hoje fizemos algumas audiências de Certidão de Nascimento tardia, algumas pessoas a partir de hoje, elas começam a existir para o Estado. Então, com o documento, agora elas vão poder acessar um benefício, vão poder pedir uma aposentadoria, ou fazer cadastro em algum auxílio dos programas sociais. Projetos dessa natureza fazem a constituição se concretizar, principalmente no trecho que fala da dignidade da pessoa humana”.

Nascido e criado em Manoel Urbano, o cirurgião-dentista Francimar Teles tem propriedade em falar sobre a localidade, pois tem vários parentes espalhados ao longo do Rio Purus. Ele fala a respeito da demanda que a população ribeirinha tem tanto na área de saúde, como referente a documentação. “É de extrema importância e de extrema necessidade para as famílias ribeirinhas principalmente pela dificuldade de acesso. Pois em vez de irem pra cidade, estão tendo a oportunidade de tirar documentos e utilizar serviços de saúde aqui bem mais perto de onde residem, além do fato de serem carentes e não tem condições financeiras. Então é muita alegria pra gente poder proporcionar esse acesso à saúde e também ver elas terem a possibilidade para documentação”.

A técnica em enfermagem Beatriz Rodrigues da Silva, visita pela primeira vez o Alto Rio Purus, mas como murbanense sabe que ações dessa natureza é de caráter urgente para a população que não tem condições para alcançar esses direitos. “Uma ação dessa é muito importante porque as pessoas não tem acesso, pois moram muito longe da zona urbana. A gente viajou quase dois dias pra chegar até aqui, então é importante porque a gente vem trazendo a saúde até eles. Da mesma forma, o Projeto Cidadão que facilita a emissão de RG, CPF, pois a maioria não pode ir por falta de barco, combustível, enfim, pois pra utilizar os serviços de saúde, a primeira exigência é o documento de identificação. Então, a relevância de uma atividade assim para comunidade é muito grande”

 

 

Casamento coletivo sob o olhar da floresta amazônica

A atividade contou ainda com o tradicional casamento coletivo que legitimou a união de sete casais, numa cerimônia simples, mas com muita alegria, conduzida pela juíza de Direito Ana Paula Saboya.

Juntos há 38 anos, Antonio Ricardo da Silva, 63 anos e Francisca Alves Leite, 53 anos, oficializaram a união. Antonio Ricardo, nasceu em Feijó, mas mudou para Manoel Urbano ainda criança quando tinha oito anos de idade. Hoje é pai de oito filhos, não sabe o número certo de netos, mas disse que já passou de vinte, além de dois bisnetos. A alegria de Antonio Ricardo era ainda maior, pois seu filho Eugênio Feitosa da Silva também se casou na mesma cerimônia. Com essa biografia, conhece bem as transformações e dificuldades da localidade. Bastante emocionado falou desse momento e a dimensão da atividade assim numa localidade tão distante.

“Soubemos do Projeto Cidadão através do agente de saúde que passou avisando. Pela distância que moramos da cidade, é uma benção pra nós um serviço chegar pra gente sem precisar gastar pra ir até zona urbana de Manoel Urbano ou até Rio Branco, pra gente é tudo muito difícil chegar lá na cidade. Então, ficamos muito agradecido por toda equipe que veio. Me sinto muito feliz” finalizou sorridente.

 

 

Agradecimento

Esta edição é realizada com apoio de diversas instituições e com financiamento do Convênio n.° 402/2020 e Convênio Plataforma +Brasil n.°904427/2020, firmado entre o Tribunal e o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Ao longo do ano foram realizadas diversas edições do Projeto Cidadão, com esse recurso, para beneficiar comunidades indígenas, ribeirinhas, áreas rurais e população em situação de vulnerabilidade social.

O Tribunal de Justiça do Acre considera impreterível destacar a importância dos parceiros que propiciaram levar justiça e cidadania nos 564 atendimentos na Comunidade Espírito Santo, em Manoel Urbano. Foram eles: delegatária Dirce Yukari do Cartório de Manoel Urbano, Ministério Público do Estado do Acre (MPAC), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Governo do Estado do Acre, por meio da Secretaria de Polícia Civil com o Instituto de Identificação, e a Prefeitura Municipal de Manoel Urbano, através da Secretarias de Educação, de Saúde e de Assistência Social.

 

Elisson Nogueira Magalhaes | Comunicação TJAC

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