O desafio de romper ciclos de violações de direitos foi a temática debatida pelos 120 participantes inscritos na atividade educativa
Nesta quarta-feira, dia 9, a Escola do Poder Judiciário (Esjud) realizou o webinário “Tráfico de Drogas, pior forma de trabalho infantil”. A palestra foi apresentada pela pós-doutoranda em Sociologia, Gorete de Jesus. O evento foi prestigiado por 120 participantes, dentre magistradas, magistrados, servidoras, servidores e acadêmicos.
As boas-vindas foram externadas pelo coordenador científico da Esjud, o juiz Giordane Dourado. “Toda criança tem direito de ser criança, por isso é preciso que toda a sociedade se mobilize de uma forma efetiva”, disse o magistrado. Sobre o tema, ele referenciou o filme brasileiro “Cidade de Deus”, onde foi retratado o crescimento do crime organizado e o trabalho infantil por meio do tráfico de drogas.
O diálogo foi fundamentado no Manual para Incidência da Temática do Tráfico de Drogas como uma das Piores Formas de Trabalho Infantil, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça, integrando o programa Fazendo Justiça: acesse aqui!
Então, a palestrante resgatou o contexto histórico, desde o Tratado de Versalhes em 1919, passando pela evolução legislativa, concluindo com os documentos que foram ratificados pelo Brasil. O destaque foi para a decisão assinada pelo ministro Edson Fachin no HC 202.574 em 2021, que mobilizou termos da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e a Convenção n° 182 da Organização Internacional do Trabalho para definir o amparo jurídico frente ao mercado de venda de drogas ilícitas, assim apontando-o como a pior forma de trabalho possível para crianças e adolescentes.
Na atualidade, o tráfico de drogas é o delito mais comum no sistema carcerário brasileiro. Segundo o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) houve um aumento exponencial de adolescentes em medida de internação relacionados ao cometimento desse tipo de ato infracional a partir de 2017. Esses dados estatísticos se agravaram desde a pandemia de covid-19, quando houve o aumento da pobreza no país, aprofundamento das desigualdades sociais e ampliação das vulnerabilidades.
Consequentemente, os reflexos da economia criminal chegam diariamente ao sistema de Justiça e na opinião da Gorete, a droga representa o colapso de toda a estrutura. As crianças e adolescentes captados vivenciam situações sérias de saúde, o uso e dependência com entorpecentes, assim como outros riscos.
Outro prisma a ser considerado é que as crianças e adolescentes que trabalham no mercado de droga são de baixa renda e geralmente não estão na escola, logo há um impacto direto nas possibilidades de futuro desses, formando assim um espiral excludente.
Esse ciclo é prejudicial ainda pela exposição à violência, tanto por parte dos superiores hierárquicos, como da polícia e facções rivais. Trata-se de um trabalho precário e prejudicial ao desenvolvimento. A proteção à crianças e adolescentes é obrigação da família, da sociedade e do Estado, portanto o diálogo reforçou a importância das medidas preventivas e assistivas para reverter essa situação.
Sobre a atuação repressiva ao narcotráfico, o juiz Raimundo Nonato comentou ainda sobre a condenação de mulheres com filhos menores de 12 anos de idade e sobre as dificuldades, afirmou que muitas vezes se sente “enxugando gelo”. No chat da conferência, vários participantes também expuseram suas reflexões sobre o narcotráfico, estigmas, perda de talentos da juventude, subnotificação, indicadores, menoridade penal, medidas alternativas e quais as possibilidades para enfrentar o panorama atual.
A juíza Louise Santana, mediadora da atividade, encerrou o debate dando relevo a mobilização jurídica para acionar os dispositivos e a jurisprudência, “nós temos o compromisso e corresponsabilidade na qualificação da porta de entrada, pois gera o aperfeiçoamento do fluxo de encaminhamento para a rede de proteção e aciona o sistema de garantias de direitos pelo qual o adolescente pode passar em razão de um ato infracional”.
Na despedida, a palestrante compartilhou a expectativa de que o aprendizado repercuta e ressoe no trabalho de todos: “é muito bom quando saímos de um lugar confortável e nos dispomos a pensar diferente. Me sinto privilegiada pelas colaborações e agradeço por ter tido essa vivência aqui”.