A Política Antimanicomial do Poder Judiciário pretende adequar a atuação do Judiciário às normas nacionais e internacionais de respeito aos direitos fundamentais das pessoas em sofrimento mental ou com deficiência psicossocial em conflito com a lei
Com a missão de adequar a atuação do Judiciário às normas nacionais e internacionais de respeito aos direitos fundamentais das pessoas em sofrimento mental ou com deficiência psicossocial em conflito com a lei, membros do Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Carcerário e Socioeducativo (GMF) visitaram, na última sexta-feira, 22, o Hospital de Saúde Mental do Acre (Hosmac).
A adequação, que faz parte da Política Antimanicomial, instituída por meio da Resolução CNJ. 487/2023, objetiva garantir a priorização do direito à saúde da pessoa que chega ao sistema de justiça criminal e socioeducativo, através do ajuste de novos fluxos e encaminhamentos, o fortalecimento do diálogo e a articulação permanente com a saúde, a assistência social e demais políticas relevantes nesse campo.
A inspeção foi realizada pela coordenadora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Carcerário e Socioeducativo, a juíza de Direito Andréa Brito, juntamente com o juiz de Direito, Robson Aleixo, e a assessora Débora Nogueira. Eles foram recebidos pelo gerente-geral do Hosmac, João Marcos Laurentino Maia, que fez o acompanhamento da equipe em todas as alas da unidade de saúde mental.
Na ocasião, a equipe averiguou as condições das enfermarias, se havia cumpridores de pena no local, questão de alimentação, higiene pessoal, visitas entre outros pontos. Os magistrados encontraram dois pacientes amarrados na cama em condições de insalubridade e solicitaram, de forma imediata, informações detalhadas sobre eles.
Para a juíza de Direito Andrea Brito, o ideal seria que todas informações relacionadas ao uso abusivo de álcool e outras drogas, bem como às condições de saúde mental sejam disponibilizadas já em sede de audiência de custódia, para que os candidatos a medidas de segurança tenham, desde a entrada no sistema prisional ou no socioeducativo.
“Ou seja, acesso às políticas de saúde de forma imediata, para que o médico faça o relatório e esse relatório chegue em até 15 dias aos atores do Sistema de Justiça que vão cuidar daquele processo”.
Segundo a juíza, é necessário que o Poder Judiciário e os demais atores do Sistema de Justiça mantenham diálogos constantes com as entidades e instituições integrantes da RAPS, no sentido de identificarem o mais rápido possível casos de transtornos de natureza mental, a fim de serem resguardos os direitos e garantias desse público, que também compreendem pessoas em situação de alcoolismo, drogadição e outros problemas de natureza psíquica.
Diretrizes do CNJ
A Resolução CNJ nº 487/2023 aponta diretrizes para a atuação da magistratura ainda durante as audiências de custódia, ou seja, ao identificar pessoas com indício de transtorno mental em caráter preventivo e apenas a partir da desinstitucionalização de quem já está em Hospital de Custódia. Essas pessoas continuarão sob os cuidados de um médico, mas também devem ser acompanhadas por uma equipe multidisciplinar qualificada e, desde então, receber atendimento de saúde apropriado e conforme as respectivas necessidades, sem prejuízo do acompanhamento da medida judicial eventualmente imposta.
Segundo o normativo, uma vez ouvidos Ministério Público e defesa, caberá à autoridade judicial o encaminhamento da pessoa ao atendimento na Rede de Atenção Psicossocial (Raps), que para além do atendimento de saúde adequado tratará de endereçar encaminhamentos voltados à proteção social e políticas e programas adequados, a partir de fluxos já estabelecidos com a rede e o modelo orientado pelo CNJ.
O artigo 13 da resolução determina que a medida de internação só deverá ser implementada se ocorrerem hipóteses excepcionais, quando não suficientes outras medidas ou quando compreendida como recurso terapêutico momentaneamente adequado no âmbito dos Projetos Terapêuticos Singulares (PTS). A internação pode ser aplicada, ainda, quando necessária para o restabelecimento da saúde da pessoa, desde que prescrita pela equipe de saúde, em alinhamento com a Lei nº 10.2016/2001 (Lei Paulo Delgado), que estabelece, em seu Art. 4º, que a internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
Local de cumprimento e articulação nacional
A internação será cumprida em leito de saúde mental em Hospital Geral ou outro equipamento de saúde referenciado pelo Centros de Atenção Psicossocial (Caps), cabendo ao Poder Judiciário atuar para que nenhuma pessoa com transtorno mental seja colocada ou mantida em unidade prisional, ainda que em enfermaria, ou seja submetida à internação em instituições com características asilares.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério da Saúde (MS) trabalham em parceria para implementar o fechamento gradual dos Hospitais de Custódia, conforme previsto há mais de 20 anos na Lei nº 10.216/2001 e regulamentado pela Política Antimanicomial do Poder Judiciário (Resolução CNJ nº 487/2023). O trabalho conjunto prevê o alinhamento de fluxos direcionados a profissionais do Judiciário e aos de saúde para endereçar e qualificar encaminhamentos em cumprimento às leis, além da assinatura de um Plano Nacional de Desinstitucionalização.