Iniciativa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Acre (Fecomércio AC) levou dois anos para ser concluída. Obra foi escrita pelo historiador Marcus Vinícius Neves
O desembargador Luís Camolez, vice-presidente do TJAC, prestigiou o lançamento do livro “Sistema Comércio Acre: Uma História Para Te Contar”. A vernissage aconteceu na noite desta quinta-feira, 31, na sede da Fecomercio/AC, em Rio Branco, reunindo, entre outros, empresários, parlamentares, representantes dos Poderes Executivos estadual e municipal.
Com 229 páginas, a obra desvela o surgimento do comércio no Acre, desde o comércio praticado pelos povos indígenas à chegada dos primeiros “regatões”, comerciantes que subiam os rios em batelões, negociando mercadorias com aqueles que encontravam, ao papel dos barracões dos seringais, formando o eixo econômico primordial do qual surgiu o comércio no Acre, sendo responsável, inclusive, pelos próprios ciclos extrativistas da borracha e da castanha, um modelo baseado no aviamento que subsiste até hoje.
Conhecido apreciador da cultura e das artes, o desembargador Camolez elogiou a iniciativa da Fecomércio e destacou a importância do registro para acreanos de todas as gerações, principalmente por se tratar de uma fonte historicamente fidedigna sobre o surgimento e o desenvolvimento do comércio no Acre.
“É um acervo muito rico, porque nós temos aqui muita coisa do século passado, do século retrasado, remontando ao início do ciclo da borracha no país. Eu fico muito feliz com essa realização, porque minha primeira Comarca foi Cruzeiro do Sul. Lá, eu ouvia os soldados da borracha contarem como foi essa questão do aviamento da borracha. E hoje o que eu vi aqui foi um retrato, quase uma retrospectiva de 29 anos, desde quando eu ouvi essas coisas em Cruzeiro do Sul. Então, eu fico muito feliz com isso. É de fato uma obra com grande riqueza de detalhes”, disse o desembargador Luís Camolez na ocasião.
O presidente da Fecomércio, Leandro Domingos, expressou satisfação com a presença do vice-presidente do TJAC e destacou que a iniciativa preserva para as próximas gerações a história do Comércio no Acre, bem como do Serviço Social do Comércio (SESC) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), instituições integrantes do Sistema de Comércio do Acre.
“Na verdade é um sonho mesmo, quando a gente assumiu a federação a gente se ressentia da falta de um documento que retratasse todo o passado da nossa federação, do SESC e do SENAC. E somente há dois, três anos atrás, a gente decidiu fazer um trabalho muito forte para poder escrever um livro que contasse a história do nosso sistema, do Sistema Comércio do Acre (…) Então nós retroagimos há alguns anos para ver como o comércio se dava na época do Seringais, até os dias atuais. E a gente está conseguindo retratar isso no livro que vamos lançar hoje. Eu considero ainda uma obra inacabada, pois já estou sonhando com a segunda edição”, ressaltou o presidente da Fecomércio AC.
O autor do livro, o historiador Marcus Vinícius Neves, em entrevista exclusiva à Comunicação do TJAC, comparou o lançamento da publicação ao parto de um filho, depois de uma “gestação difícil”, passando por um longo período de pesquisas e entrevistas, uma vez que o material documentado era escasso e, em alguns casos, até mesmo inexistente, o que representou um grande desafio na produção do material.
Comércio no Acre se desenvolveu graças aos ciclos extrativistas: uma meia verdade
“Você veja as ironias da história. Se diz, se conta, desde sempre, que o Acre foi formado pelos seringais. A exploração da borracha, aquela história toda que todo mundo conhece. O que ninguém se deu conta é que para cada seringal havia um barracão de mercadoria, que era um comércio instalado ali dentro. O eixo do seringais se baseava no sistema de aviamento, que era o sistema comercial, porque você adiantava mercadorias para receber a safra depois de colhida e, a partir desse eixo do comércio, se estruturou um modo de vida aqui nessa região da Amazônia que envolveu os indígenas. Então o livro começa a tratar dos povos originários, dos modelos de comércio que os indígenas já praticavam antes de chegarem os seringais. E depois é que vêm os seringais e o sistema de aviamento. E veja bem, eu não estou tratando aqui de um passado distante. Não. Ainda hoje você tem nos rios acreanos os que antes eram os regatões da época: os marreteiros que continuam fornecendo mercadorias em troca da produção de alimentos de origem extrativista, como acontece, por exemplo, em Cruzeiro do Sul. Aquela região comercial ali recebe os ribeirinhos vindos com a sua produção e é tudo anotado no caderninho. O sistema de aviamento continua vivo no presente. Aí eu comecei a perceber que isso era um erro estrutural. Quando a gente fala que o Acre surgiu graças aos ciclos da borracha, é uma meia verdade”, explicou Marcus Vinícius Neves.