Objetivo é contribuir na fundamentação das decisões judiciais e estabelecer diálogo entre Direito Brasileiro/Internacional e Direitos Humanos
Pela defesa da igualdade, pluralidade e garantia dos direitos de todas as pessoas, a Escola do Poder Judiciário do Acre (Esjud) promoveu nessa terça-feira, 27, o seminário “Direito dos Povos Indígenas e Poder Judiciário”. Realizada em um inédito formato interdisciplinar no Palácio da Justiça, a atividade foi bastante concorrida, com a participação das principais instituições do Estado.
A mesa de honra teve as presenças do desembargador Luís Camolez, vice-presidente do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC), do diretor da Esjud, desembargador Elcio Mendes, do desembargador Nonato Maia, do juiz de Direito Danniel Bomfim, coordenador do Seminário, da procuradora-geral de Justiça adjunta, Rita de Cássia, representando o Ministério Público Estadual, do corregedor ministerial Álvaro Pereira, e do secretário de Planejamento do Estado, coronel Ricardo Brandão.
O presidente da Associação dos Magistrados do Acre (Asmac), Gilberto Matos, o juiz-auxiliar do Supremo Tribunal Federal (STF), Fábio Esteves, magistradas e magistrados, diversas outras autoridades, servidoras e servidores, bem como operadores do Direito integraram a agenda presencialmente, e outros via transmissão pelo Google Meet.
Abertura
A solenidade foi iluminada pelos acordes do Hino Acreano, interpretado pela cantora Yvana Pacífico, que também deu voz à canção “Acre Distante”, emocionando a plateia. O artista Marcel Longuini encantou o público com “Rios Voadores”, de sua autoria, uma homenagem à singularidade da região Amazônica, onde a situação climática é diferenciada em decorrência da vegetação, da geografia e da natureza privilegiada.
Os discursos
“Essa é uma oportunidade ímpar. A fala é de enobrecimento de tudo que a Escola do Poder Judiciário tem feito. Eu sou um árduo defensor da Escola, mesmo porque sou egresso da Escola da Magistratura de Rondônia. Como integrante da turma de mestrado e vice-presidente do nosso Tribunal, fico muito feliz com o tema. É grandioso você se deparar com as etnias, quem vai para o interior. Eu tive essa oportunidade, fui até a Foz do Breu, até a Aldeia Nova Fronteira, que é um pouco abaixo de Santa Rosa do Purus. Eu aprendi muito com isso”, declarou o desembargador Luís Camolez, que representou a Presidência do TJAC.
O desembargador Elcio Mendes salientou a especificidade do povo acreano e o calor humano contagiante. “Essa música que tocou agora, principalmente para nós que viemos de outros estados da federação, vai direto aos corações dos nossos dez novos juízes, que na sua maioria são pessoas de outros rincões. Ela reflete a aceitação do povo do Acre em nos recepcionar com toda atenção e dedicação. O evento de hoje é o resumo de tudo isso, é o que se espera de nós que viemos de outros rincões, de atender da melhor forma e com todo carinho essa população que nos recebe com a maior atenção e também respeito”, disse.
Também falou sobre a programação do Seminário e sua contribuição para a Escola e ao próprio Tribunal. “O adjetivo que melhor define esta data é histórico, de um lado temos a Escola do Poder Judiciário promovendo essa atividade tão relevante, nesse formato totalmente diferenciado, com uma parte aqui e a perspectiva de realizar futuramente a visita em determinadas comunidades indígenas, justamente para efeito dessa aproximação. E, ao mesmo tempo, o encontro com as respeitadas instituições que estão aqui presentes, e, mais ainda, quando nós verificamos o clima, quando observamos nossas comunidades indígenas, percebemos o nosso dia a dia muito próximo aqui no estado do Acre”, afirmou.
O diretor da Esjud deixou uma mensagem sobre a missão do Órgão de Ensino e da Justiça Acreana. “Temos trabalhado para que a Escola seja cada vez mais inclusiva. Abordamos nesse período de Formação Inicial acerca da religião da Amazônia, da história do Acre, ou seja, todos os juízes conhecem hoje a nossa história, fundamental conhecerem nossa realidade. E nós devemos sim estender as mãos para esse acolhimento e o abraço de respeito a todos que têm sede de justiça. Somente assim construiremos um Acre e um Brasil onde as vozes indígenas são verdadeiramente ouvidas e seus valores e cultura respeitados. O papel dos povos indígenas é imprescindível para o equilíbrio ambiental do planeta, no entanto, muito mais do que isso para a própria afirmação de nossa origem e existência e, com certeza, estamos vivenciando isso, a necessidade de respeitar os anseios para resguardar o futuro de todo o Brasil. Que continuemos firmes na defesa da liberdade, da pluralidade, da democracia e dos Direitos Humanos”, concluiu.
Secretária dos Povos Indígenas, Francisca Arara, destacou a necessidade de um olhar mais atento sobre a temática. “A atividade é muito importante, porque como parte do público é da magistrados, precisam conhecer e entender também um pouco da peculiaridade que é o nosso povo. Entender que tem a lei judiciária, mas também tem a lei própria dos indígenas, que nós somos diferentes, que moramos em regiões diferentes, e que nós temos uma raiz, uma história. Então hoje eu pude abordar pra eles os quatro tempos que nós temos aqui no Acre, tempo das malocas, tempo das correrias, tempo do cativeiro e o tempo do Direito, que hoje é o tempo da conquista depois da demarcação. Veio a construção, a criação da política de educação escolar indígena, da saúde, os direitos de ir e vir e o direito de falar. Então, trazer essas experiências, esses intercâmbios sempre é muito bom. Espero que aconteça outros mais, pra gente tá fazendo essa troca”, considerou.
Ouvidora-geral da Defensoria Pública do Estado (DPE), Soleane Manchineri, foi a primeira mulher indígena a ser eleita para esse cargo no Brasil. “Importância para a população indígena e também para outras populações vulneráveis e sensibilizar as pessoas que vão assumir esses novos cargos, porque uma pessoa que conhece a realidade, ela tem uma aproximação mais qualificada. E, a partir dessa aproximação, consegue compreender a realidade daquela pessoa que está em situação de vulnerabilidade, e fazer encaminhamentos que beneficiem o assistido. Também fazer com que esse conhecimento seja diferente e fazer com que esse diálogo seja qualificado e os magistrados reconheçam o Acre como lugar em que podem ser acolhidos e promover Direitos Humanos”, destacou.
Programação
O juiz de Direito Danniel Bomfim ministrou a respeito do “Direito dos Povos Indígenas e Poder Judiciário”, tema central, abordando os avanços legislativos, o ordenamento jurídico e os desafios que devem ser enfrentados pelas instituições.
Em seguida, o juiz-auxiliar do STF, Fábio Esteves, conduziu o Painel I “Controle de Convencionalidade – Direito Internacional Indígena”, trazendo uma análise da compatibilidade dos atos internos do Brasil (comissivos ou omissivos), em comparação com tratados internacionais, atos unilaterais, princípios gerais do Direito, etc.
A secretária estadual Francisca Arara, discorreu no Painel II sobre o tema “História e Realidade dos Povos Indígenas no Acre”.
O Painel III, “Resolução dos Conflitos Internos pelas Comunidades Indígenas. Segurança Pública nas Aldeias (facção nas aldeias, violência contra as mulheres indígenas, invasões em terras indígenas)”, foi apresentado pela ouvidora-geral Soleane Manchineri.
O Painel IV, “Acre e o Processo de Consulta Prévia Livre e Informada e Exposição do Estudo de Caso Estrada para Pucalpa”, foi descortinado por Lucas Dias, procurador da República/MPF.
O Painel V, “Povos Indígenas e Olhar antropológico: laudo antropológico nos processos que envolvem indígenas”, pelo professor Marcos Matos, da Universidade Federal do Acre (Ufac).
Já o Painel VI, “Indigenizando la Consulta Previa: re-pensando la protección de los pueblos indígenas”, teve como facilitador o consultor colombiano Julián Martínez.
No final do dia, a programação foi concluída com a mesa-redonda “O Papel das Instituições na Promoção e Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas”, com participação de Elcio Filho Manchineri. O juiz de Direito Clovis Lodi e Nedina Yawanawa, diretora indígena da Secretaria do Meio Ambiente e das Políticas Indígenas do Acre (Semapi), atuaram como mediadores, conduzindo os debates.