Decisão considera que a própria lei que dispõe sobre o funcionamento do órgão regulador prevê a possibilidade de utilização de fármacos ainda em testes.
O Juízo da Vara Única da Comarca de Xapuri julgou procedente o pedido liminar formulado por uma paciente acometida de câncer de pâncreas em estágio avançado, obrigando, assim, a empresa PDT Pharma Indústria e Comércio de Produtos Farmacêuticos à venda “por preço de mercado” da substância fosfoetanolamina sintética, composto químico ainda em fase de estudos e testes experimentais no âmbito da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A decisão, do juiz de Direito Luís Pinto, ainda aguardando publicação no Diário da Justiça Eletrônico (DJE), considera que a ausência de licença e registro por parte do órgão regulador não constitui obstáculo à aquisição do fármaco por parte de pacientes portadores de câncer, confundindo-se, por outro lado, com o próprio direito dos pacientes à continuidade do tratamento médico, “especialmente quando as terapias convencionais não trazem o resultado esperado”.
Entenda o caso
Segundo os autos, a autora foi diagnosticada com câncer de pâncreas em estágio de metástase “com inúmeras complicações”, incluído o alastramento da doença a outros órgãos vitais como fígado e pulmões.
Após tomar ciência dos “possíveis benefícios da substância fosfoetanolamina sintética”, produzida pela empresa demandada no âmbito de pesquisa científica independente realizada por um professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), a autora decidiu buscar junto à Vara Cível da Comarca de Xapuri a obrigação da fabricante à venda do composto químico, cuja comercialização ainda não foi liberada devido à ausência de licença e registro por parte da Anvisa.
No pedido à Justiça, a autora assinalou que a substância representa, nesse momento, uma possibilidade real de melhora na qualidade de vida, além de controle dos “sintomas nefastos do câncer (…), bem como uma possível cura da doença”.
Decisão
Ao analisar o pedido liminar, o juiz de Direito Luís Pinto entendeu que a incidência dos pré-requisitos autorizadores da antecipação da tutela foi satisfatoriamente demonstrada nos autos, não havendo, por outro lado, motivos suficientes a justificar eventual impedimento à aquisição do composto químico, “especialmente quando as terapias convencionais não trazem o resultado esperado”.
Nesse sentido, o magistrado destacou que se por um lado a autora “está acometida por uma doença grave, que causa intenso sofrimento físico e emocional”, por outro, o pedido para utilização do fármaco – ainda que em estágio de pesquisa – encontra respaldo tanto no Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) quanto na Constituição Federal de 1988.
O titular da Vara Única da Comarca de Xapuri ressaltou ainda que a própria Lei nº 6.360/1976, que dispõe sobre a Vigilância Sanitária no Brasil, prevê o afastamento de necessidade de registro junto ao órgão em casos de “medicamentos novos, destinados exclusivamente a uso experimental, sob controle médico, podendo, inclusive, ser importados mediante expressa autorização do Ministério da Saúde”.
Luís Pinto também considerou que a utilização da substância fosfoetanolamina sintética se confunde, nesse momento, com o próprio direito da autora à continuidade do tratamento médico, além de se constituir em uma “última esperança de obter uma melhora em seu quadro clínico”, não se justificando eventual negativa do pedido formulado junto à Justiça Estadual.
Assim, o magistrado julgou procedente o pedido de tutela de urgência e determinou à PDT Pharma Indústria e Comércio de Produtos Farmacêuticos que proceda à venda, “mediante pagamento do preço de mercado”, de 1.096 cápsulas da substância fosfoetanolamina sintética (quantidade equivalente a um ano de tratamento) à autora, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00.
Ainda cabe recurso da decisão.